domingo, fevereiro 04, 2007

Presidenta do STF aborda o processo eletrônico e a súmula vinculante, ao discursar na abertura do ano legislativo.

Desejo ressaltar, de modo particular, os esforços empreendidos pelo Conselho, no sentido de dar seqüência às medidas aprovadas por este Congresso, para o efeito de tornar o sistema judiciário brasileiro mais operante, célere e racional.
Neste sentido, a Lei nº 11.419/2006 estabelece as diretrizes para adoção do processo eletrônico.
E, tão importante quanto a aprovação da lei, foi a inserção de previsão orçamentária que habilita o Conselho a suplementar as eventuais deficiências de recursos dos Judiciários das unidades federadas, para a indispensável modernização de seus equipamentos.
Tenho a satisfação de comunicar que, a partir do próximo mês de março, 17 dos 26 tribunais estaduais estarão prontos para instalar e inaugurar varas-piloto de processo eletrônico. Dentre os juizados especiais federais, cerca de 80% já utilizam o processo virtual.
A redução de tempo e de custo é significativa. O impacto ambiental também. Apenas o Supremo Tribunal Federal movimentou, aproximadamente, 680 toneladas de papel durante o ano de 2006, considerado o protocolo de recursos e a remessa à origem dos feitos julgados.
Quero salientar que, ao longo dos estudos desenvolvidos, foi preocupação constante dos representantes e técnicos dos tribunais de justiça, federais e do trabalho garantir que a adaptação à nova metodologia não signifique um retraimento por parte dos profissionais pouco afeitos ao meio tecnológico. Tratou-se de criar ambiente amigável de transição entre o sistema tradicional e a inovação. E, tenho confiança que, assim como o povo deste país, sem distinção de escolaridade, assimilou prontamente e sem dificuldade o uso da urna eletrônica, também em breve espaço de tempo, qualquer eventual estranheza quanto ao novo sistema será superada.
Elas estão de tal forma incorporadas no nosso dia-a-dia que não mais as percebemos como algo novo.
Neste campo não é possível retroceder. O Brasil é fértil em soluções criativas de emprego da tecnologia. Elas estão de tal forma incorporadas no nosso dia-a-dia que não mais as percebemos como algo novo.
Pois bem, é chegada a hora de estender também à rotina judiciária a utilização da tecnologia disponível e de fácil acesso. Ela nos permitirá realizar muito melhor as tarefas meramente repetitivas e burocráticas que até agora assoberbam nosso corpo funcional. Ela proporcionará, sobretudo, uma velocidade de resposta à sociedade antes impensável.
Em 2003, demonstrei, em seminário internacional na Costa Rica, o sistema utilizado nos juizados especiais previdenciários, acessível on line via internet.
Na ação ordinária que selecionei para apresentar, apenas dez dias haviam se passado entre o ajuizamento e a sentença de primeiro grau, sem qualquer arranhão às garantias do devido processo legal.
Uma tal redução do tempo de resposta do sistema decorre da automação de todas as etapas não-criativas, de mero registro, comunicação ou impulso processual. Fica posto em relevo o tempo nobre do processo, aquele em que se produzem peças em que seja necessária a reflexão, a elaboração e o amadurecimento de entendimento. Este é o tempo em que os advogados das partes produzem seus arrazoados, o Ministério Público se manifesta ou os magistrados elaboram suas decisões.
Sabem os senhores e senhoras congressistas que, ao aprovarem a Lei nº 11.419/2006, deram ao Judiciário brasileiro a real possibilidade de vencer a morosidade que tem entravado a vida econômica do país e submetido à crítica impiedosa uma instituição que se legitimou, ao longo de nossa história, pela tradição de imparcialidade, de independência e de alta qualificação de seus integrantes. Guardaremos ciosamente estes valores básicos. Mas, no que diz respeito à eficiência, o Poder Judiciário será outro, após a progressiva implantação do processo eletrônico.
Outra das providências aprovadas por Vossas Excelências, a Lei nº 11.417/2006, que estabeleceu a súmula vinculante, também terá reflexos de profunda repercussão no modo como a sociedade, os poderes de Estado e o próprio judiciário se relacionam com o ordenamento jurídico em sua interpretação última.
O Visconde de Mauá, em sua Exposição aos Credores e ao Público, editada em 1878, relata com aguda crítica uma de tantas querelas judiciais em que se viu envolvido.
"Falindo os devedores, diz ele, cobrou a casa os títulos de que estava de posse até a importância dos seus adiantamentos, e entregou o saldo aos administradores da massa."
No entanto, sentença do Tribunal do Commercio veio a confiscar parte desses adiantamentos.
Encaminhado recurso, retoma o Visconde, o Supremo Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, fulminou essa sentença, por injustiça notória e nulidade manifesta.
Porém, uma vez anulada a sentença, em novo julgamento, um Tribunal inferior reexaminou a causa e, por um único voto de desempate, o do presidente do tribunal, fez tábula rasa do voto unânime do Supremo Tribunal de Justiça e o Banco Mauá perdeu a causa ! Será sensato este regimen judiciário ? indaga o estupefato Mauá.
De fato, não pode ser operante um sistema judiciário em que a mesma questão de direito receba, indefinidamente, diversa e variada interpretação, ao sabor das filiações doutrinárias dos julgadores.
Pois bem, é a esse descrédito da lógica jurídica, a essa insegurança quanto ao que seja afinal a lei do país, que põe cobro a medida aprovada por este Parlamento e consubstanciada na Lei nº 11.417/2006.
A partir de agora, quando o Supremo Tribunal Federal houver definido formalmente uma questão de direito, aplicando-lhe o efeito vinculante e fazendo-a inserir no enunciado de sua súmula, pacifica-se a discussão nos juízos inferiores e, sobretudo, deverão respeitar a interpretação fixada todos os agentes públicos, evitando-se o surgimento de novas ações.
O sistema de controle de constitucionalidade brasileiro, tributário, em seu primeiro momento, do sistema norte-americano, admite o controle chamado difuso, na via do recurso extraordinário.
Contrariamente, porém, ao sistema no qual se espelhou, o brasileiro não contava, desde 1988, com qualquer filtro de acesso, a semelhança do certiorari norte-americano.
Desse descuido com a funcionalidade da Corte resultou que toda e qualquer querela de somenos, entre partes individuais e com efeitos meramente patrimoniais, na qual se pudesse invocar uma remota raiz em matéria constitucional, podia ocupar a atenção do tribunal em igualdade de condições com as graves questões que dizem respeito ao equilíbrio federativo ou à governabilidade do país.
A Lei nº 11.418/2006 põe cobro a essa situação e devolve ao Supremo Tribunal Federal condições de funcionamento razoável.
Por isso, formalmente o Poder Judiciário Brasileiro manifesta seu reconhecimento pelo esforço de aperfeiçoamento institucional consubstanciado na aprovação dos três projetos de lei que darão uma nova feição ao serviço público que nos incumbe prestar."

Para ler o discurso na íntegra, acesse aqui.