domingo, novembro 30, 2008

O IRRF E OS RENDIMENTOS TRABALHISTAS PAGOS ACUMULADAMENTE EM RAZÃO DE DECISÃO JUDICIAL. A SÚMULA 368 DO TST E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. LEI 8.541/92.

Muitos trabalhadores questionam a validade da cobrança do Imposto de Renda sobre os rendimentos trabalhistas acumulados, pagos de uma só vez por força de decisão judicial e que, não fosse a inércia do empregador em cumprir com sua obrigação legal, não haveria tal incidência, vez que as parcelas, mês a mês, não seriam tributáveis.

Em resumo, argumentam que se o pagamento tivesse ocorrido espontaneamente pelo empregador, mês a mês, não haveria tributação do IRRF. No entanto, somadas as parcelas devidas e não pagas, acumulando-se o seu valor, a consolidação desse resultado faz com que o IRRF incida, provocando, no mínimo, um prejuízo ao trabalhador: a) que ora terá que se valer de uma declaração fiscal para tentar obter a devolução do valor excedente; b) ora não recuperará a parcela descontada sob o título de imposto devido.

A exigência da observância de retenção e recolhimento do IRRF, pela Justiça do Trabalho, encontra previsão legal na Lei n.º 8.541 /92, art. 46:

Art. 46. O imposto sobre a renda incidente sobre os rendimentos pagos em cumprimento de decisão judicial será retido na fonte pela pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento, no momento em que, por qualquer forma, o rendimento se torne disponível para o beneficiário.
§ 1° Fica dispensada a soma dos rendimentos pagos no mês, para aplicação da alíquota correspondente, nos casos de:
I - juros e indenizações por lucros cessantes;
II - honorários advocatícios;
III - remuneração pela prestação de serviços de engenheiro, médico, contador, leiloeiro, perito, assistente técnico, avaliador, síndico, testamenteiro e liquidante.
§ 2° Quando se tratar de rendimento sujeito à aplicação da tabela progressiva, deverá ser utilizada a tabela vigente no mês de pagamento.
E o entendimento cristalizado na jurisprudência trabalhista segue no sentido de que a incidência tributária é feita sob a consolidação dos valores da condenação. Eis o teor da Súmula 368 do TST, especialmente quanto ao item II:

"DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS. COMPETÊNCIA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. FORMA DE CÁLCULO (inciso I alterado) - Res. 138/2005, DJ 23, 24 e 25.11.2005
I. A Justiça do Trabalho é competente para determinar o recolhimento das con-tribuições fiscais. A competência da Justiça do Trabalho, quanto à execução das contribuições previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia que proferir e aos valores, objeto de acordo homologado, que integrem o salário-de-contribuição. (ex-OJ nº 141 da SBDI-1 - inserida em 27.11.1998 ).
II. É do empregador a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias e fiscais, resultante de crédito do empregado oriundo de condenação judicial,
devendo incidir, em relação aos descontos fiscais, sobre o valor total da condenação, referente às parcelas tributáveis, calculado ao final, nos termos da Lei nº 8.541, de 23.12.1992, art. 46 e Provimento da CGJT nº 01/1996. (ex-OJs nºs 32 e 228 da SBDI-1 - inseridas, respectivamente, em 14.03.1994 e 20.06.2001)
III. Em se tratando de descontos previdenciários, o critério de apuração encontra-se disciplinado no art. 276, §4º, do Decreto n º 3.048/1999 que regulamentou a Lei nº 8.212/1991 e determina que a contribuição do empregado, no caso de a-ções trabalhistas, seja calculada mês a mês, aplicando-se as alíquotas previstas no art. 198, observado o limite máximo do salário de contribuição. (ex-OJs nºs 32 e 228 da SBDI-1 – inseridas, respectivamente, em 14.03.1994 e 20.06.2001)" (destaquei).
Em sentido oposto, no entanto, caminha a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, quando se trata de analisar a incidência do Imposto de Renda sobre o valor da condenação de proventos decorrentes de aposentadorias ou pensões. Veja a jurisprudência sobre o tema, enfrentando o mesmo art. 46 da Lei 8.541/92 e de modo uníssono pelas 1ª e 2ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça:

"TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. AÇÃO PROPOSTA POR SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL PLEITEANDO O PAGAMENTO DE DIFERENÇAS DE VENCIMENTO E PROVENTOS DE INATIVIDADE. RECONHECIMENTO POR DECISÃO JUDICIAL. ARTIGO 46 DA LEI 8.541/92. NÃO-PREQUESTIONAMENTO DO ART. 730 DO CPC. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 282 E 356/STF E 211 E 320/STJ.
1. Cuidam os presentes autos de agravo de instrumento interposto pelo MUNICÍPIO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO em face de decisão do juízo de primeiro grau que determinou fosse efetuado o depósito de valores retidos na fonte, no prazo de 10 dias. O TJSP negou provimento ao agravo sob o fundamento de que é defeso ao devedor proceder a depósito de quantia inferior ao determinado. Recurso especial da Municipalidade apontando violação dos arts. 730 do CPC, 46 da Lei Federal nº 8.541/92 e 55 do Decreto nº 3.009/99, além de dissídio jurisprudencial. Requer a reforma do acórdão, declarando-se a extinção da execução uma vez que integralmente satisfeito o crédito do exeqüente; ou se assim não o entendendo, seja determinada a citação da Fazenda Pública, nos termos do art. 730 do CPC ou, ainda, expedido precatório complementar para pagamento de eventual diferença apurada. Sem contra-razões.
2. Na espécie, a Municipalidade efetuou descontos, a título de retenção na fonte, de imposto de renda e de contribuição de assistência médica sobre diferenças de vencimento e proventos de inatividade reconhecidas por sentença.
3. O artigo 46 da Lei 8.541/92 atribuiu à fonte pagadora a retenção e o recolhimento do imposto de renda relativo a valores recebidos em virtude de decisão judicial. Deve haver reforma, portanto, do decidido nas instâncias ordinárias, revelando-se absolutamente legal o procedimento do Município, mas somente em relação à retenção do imposto de renda. Esclareça-se que a retenção sobre a contribuição de assistência médica não é objeto de discussão neste recurso especial, concluindo-se que a Fazenda proceda ao depósito desses valores conforme consignado pelas instâncias ordinárias.
4. Há necessidade de ser esclarecido que
deve ocorrer a retenção do imposto de renda somente se, no caso, estivesse o contribuinte sujeito à incidência mensal da exação. Ou seja, o pagamento acumulado, após determinação judicial, não pode gerar tributação se os valores pagos mensalmente, oportunamente, fossem isentos.
5. No julgamento do REsp 538.137/RS, de minha relatoria, DJ 15.12.2003, a Primeira Turma desta Casa assentou: "
O art. 46, da Lei nº 8.541/92, deve ser interpretado nos seguintes moldes: só haverá retenção na fonte de rendimentos pagos em cumprimento à decisão judicial quando, isoladamente, tais valores ensejarem o desconto do imposto, caso contrário, ter-se-ia hipótese condenável: sobre valores isoladamente isentos de imposto de renda o ente público moroso retiraria benefício caracterizadamente indevido." 6. As questões referentes à necessidade de citação do ente público (art. 730 do CPC), do art. 55 do Decreto nº 3.009/99 e de expedição de precatório para a efetivação do pagamento não foram ventiladas na instância de origem, faltando o prequestionamento viabilizador desta seara especial. Incidentes as Súmulas 282 e 356/STF e 211/STJ.
Especificamente em relação ao art. 730 do CPC, verifica-se que somente foi consignado no voto-vencido, fato que conduz à aplicação da Súmula 320/STJ ("A questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requisito do prequestionamento").
7. Recurso especial parcialmente provido para o fim de determinar a reforma do acórdão recorrido somente em relação à desnecessidade do Município efetuar o depósito dos valores retidos a título de imposto de renda.
(REsp 762.920/SP, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/05/2006, DJ 29/05/2006 p. 187)" (destaquei).

"
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS PAGOS DE MODO ACUMULADO. CASO RECEBIDOS MENSALMENTE ESTARIAM DENTRO DA FAIXA DE ISENTOS. IMPOSSIBILIDADE DE RETENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. PRECEDENTES.
1. Trata-se de ação ordinária de repetição de indébito, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada por ÁLVARO KIRSCH em face da União Federal e o INSS, objetivando a devolução dos valores retidos a título de imposto de renda com a incidência das cominações legais.
O autor, em 27/11/1997, requereu a concessão de aposentadoria por tempo de serviço. Em 29/11/2001, reconhecendo o direito ao benefício, o INSS efetuou o pagamento dos proventos em atraso de forma acumulada com retenção de imposto de renda. O questionamento autoral foi no sentido de que, caso as parcelas fossem pagas na época própria ou seja, mês a mês, não teria sofrido a referida tributação, razão pela qual pleiteou a devolução dos valores recolhidos de forma indevida. A medida antecipatória foi indeferida.
Sobreveio a sentença, julgando procedente o pedido, condenando a União Federal a restituir ao autor o imposto de renda retido na fonte pelo INSS asseverando que: "No presente caso, a retenção do imposto de renda pelo INSS ofende o princípio constitucional da isonomia, eis que outros segurados que se encontravam em situação idêntica, porém, que perceberam os proventos de seu benefício mês a mês e não de forma acumulada, não se sujeitaram à incidência da questionada tributação. Com efeito, não se pode imputar ao segurado a responsabilidade pelo atraso no pagamento de proventos, sob pena de se beneficiar o Fisco com o retardamento injustificado do INSS no cumprimento de suas obrigações perante os aposentados e pensionistas". (fls. 37/38). Apelaram o INSS e a União Federal. O egrégio Tribunal Regional Federal manteve inalterada a decisão singular. Nesta via recursal, a União Federal alega negativa de vigência do art. 12 da Lei nº 7.713/88. Em suas razões, aduz que os rendimentos recebidos de forma acumulada é gênero para qualquer tipo de renda obtida estando, portanto, sujeita à tributação. Sem contra-razões, conforme certidão de fl. 82.
2.
Não se pode impor prejuízo pecuniário à parte em razão do procedimento administrativo utilizado para o atendimento do pedido à seguridade social que, ao final, mostrou-se legítimo, tanto que deferido, devendo ser garantido ao contribuinte à isenção de imposto de renda, uma vez que se recebido mensalmente, o benefício estaria isento de tributação.
3.
Ainda que em confronto com o disposto no art. 3º, § único, da Lei 9.250/95, o emprego dessa exegese confere tratamento justo ao caso em comento, porquanto se concedida a tributação tal como pleiteada pela Fazenda estaria-se duplamente penalizando o segurado que não recebeu os parcos benefícios na época oportuna.
4. Precedentes: REsp 723196/RS, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 30/05/2005; REsp 505081/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 31/05/2004 e REsp 667238/RJ, desta Relatoria, DJ de 28/02/2005.
5. Recurso especial não-provido.
(REsp 758.779/SC, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/04/2006, DJ 22/05/2006 p. 164)" (destaquei)

"
TRIBUTÁRIO. AÇÃO REVISIONAL DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PARCELAS ATRASADAS RECEBIDAS ACUMULADAMENTE. VALOR MENSAL DO BENEFÍCIO ISENTO DE IMPOSTO DE RENDA. NÃO-INCIDÊNCIA DA EXAÇÃO.
1.
O pagamento decorrente de ato ilegal da Administração não constitui fato gerador de tributo.
2.
O imposto de renda não incide sobre os valores pagos de uma só vez pelo INSS, quando o reajuste do benefício determinado na sentença condenatória não resultar em valor mensal maior que o limite legal fixado para isenção do referido imposto.
3. A hipótese in foco versa o cabimento da incidência do imposto de renda sobre proventos de aposentadoria recebidos incorretamente, por isso que, à luz da tipicidade estrita, inerente ao direito tributário, impõe-se a manutenção do acórdão recorrido.
4.
O Direito Tributário admite na aplicação da lei tributária o instituto da eqüidade, que é a justiça no caso concreto. Ora, se os proventos, mesmos revistos, não seriam tributáveis no mês em que implementados, também não devem sê-lo quando acumulados pelo pagamento a menor pela entidade pública. Ocorrendo o equívoco da Administração, o resultado judicial da ação não pode servir de base à incidência, sob pena de sancionar-se o contribuinte por ato do Fisco, violando os princípios da Legalidade e da Isonomia, mercê de chancelar o enriquecimento sem causa da Administração.
5.O aposentado não pode ser apenado pela desídia da autarquia, que negligenciou-se em aplicar os índices legais de reajuste do benefício. Nessas hipóteses, a revisão judicial tem natureza de indenização, pelo que o aposentado deixou de receber mês a mês.
6. Recurso especial desprovido.
(REsp 617.081/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/04/2006, DJ 29/05/2006 p. 159)" (destaquei).


"RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO ACUMULADO EFETUADO COM ATRASO PELO INSS. VALOR MENSAL ISENTO DE IMPOSTO DE RENDA. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO MONTANTE RECEBIDO. NÃO-INCIDÊNCIA DO TRIBUTO. PRECEDENTES DA PRIMEIRA TURMA.
Merece prevalecer o entendimento esposado pela Primeira Turma de que "o imposto de renda não incide sobre os valores pagos de uma só vez pela Administração, quando a diferença do benefício determinado na sentença condenatória não resultar em valor mensal maior que o limite legal fixado para isenção do imposto de renda" (REsp 505081/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 31.05.2004) .
Recurso especial improvido.
(REsp 723.196/RS, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/03/2005, DJ 30/05/2005 p. 346)" (destaquei).


Ainda que não se possa atribuir, na maior parte das vezes, à Administração Pública o fato de estar auferindo vantagens em razão de seu próprio erro - já que nos processos trabalhistas a lesão foi causada por empregadores geralmente privados, isto não invalida o entendimento uníssono do STJ.

Primeiro, porque a questão tem sido enfocada, inclusive, sob os aspectos da tutela jurisdicional específica, segundo a qual deve-se entregar a quem vem pedir amparo judicial, o bem jurídico pretendido em condições as mais próximas possíveis ao direito que se violou. E se mantidas as condições previsíveis para o momento adequado da obrigação (e que não se cumpriu), não haveria incidência tributária.

Segundo, porque a própria legislação tributária autoriza, na sua interpretação, o uso da equidade.

Terceiro, porque mesmo não tendo na Administração Pública a origem da lesão (e isto é um ponto relativo, já que cabe ao Estado o dever de fiscalizar o cumprimento da Legislação do Trabalho), não se pode negar que a incidência tributária sobre o valor total da condenação poderá gerar uma exação que não incidiria sobre a obrigação se cumprida a tempo e modo. Esta mudança de cenário, sem dúvida, é favorável à Fazenda Pública e prejudicial ao contribuinte.

De qualquer sorte, o cenário sugere uma maior reflexão sobre a atualidade da Súmula 368/TST.

Quem quiser ler mais sobre o tema, poderá acessar a notícia publicada em 13/11/ 2008 no site do STJ.

(Postado por Kleber Waki).

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